Ao
passar no canteiro frontal à SQN 111, avistei uma grande sapucaia sob a guarda
de uma colmeia de arapuá instalada na planta. Esse fruto é bastante cobiçado e
bem antes de maduro são retirados apenas para aproveitar a cumbuca. Sei que o
momento é inoportuno, porém resolvi subir para colher o coco que contém
castanhas macias e saborosas e apresentá-lo a Antônio e Ellen. Miguel já me
disse que não vale a pena escalar um sapucaizeiro de brincadeira, o perigo está
na sua áspera casca que corta como uma navalha e se acaso uma pessoa escorregar
de barriga pelo seu fuste ou um galho grosso vai ficar com as tripas de fora.
Eu considero essa árvore uma das mais bonitas plantadas no Plano Piloto-DF. Sua
safra é de agosto a outubro. O fruto maduro coincide quando a árvore tem
perdido todas as folhas. Em setembro, vemos as diferentes fisionomias do seu
ciclo anual, uns exemplares ainda tem a folhagem antiga, outros estão
desfolhados e alguns já têm flores e folhas jovens nascidas ao mesmo tempo. São
bonitas flores violáceas, porém essa beleza é apagada pelo vermelho brilhoso
das folhas novas e é nesse momento em que a árvore está no auge de sua
extraordinária formosura. Miguel chegou com a filmadora. Mostrei a ele o plano
para colher o fruto e pedi-lhe para filmar a tarefa. Subi e rapidamente e
peguei o coco. Um homem encontra enorme dificuldade para conseguir colher o
coco do sapucaizeiro usando somente as mãos. Sem um objeto cortante o esforço é
hercúleo. (Uns dias passados um homem tentava derrubar o coco da sapucaia
arremessando um porrete de madeira. Observei Miguel pegar outro porrete, imitar
o homem e dizer “dessa vez você quase acertou” e deixou-o na sua tentativa. Eu
disse “porra! Tu sabes que ele nunca vai derrubar. Qual é a tua”? E ele me
respondeu: “quero lhe impor um trauma para que ele nunca mais use porretes para
derrubar frutas e assim eliminar um concorrente mal educado; se fosse em um pé
de manga ele estragaria dezenas para derrubar a fruta mirada”). O arapuá
me atacou numa proporção maior do que imaginei, e, mesmo não possuindo ferrão
ela incomoda enrolando-se no cabelo e penetrando no ouvido; e para evitar isso
é preciso ficar dando tapas na orelha. Acossado pelas abelhas, achei mais
conveniente descer utilizando um galho como paraquedas de uma altura de onze
metros. O sapucaizeiro é ideal para esse tipo de operação devido ao formato de
sua copa e resistência da sua madeira, que enverga, pode até rachar, mas não se
rompe.
Miguel prevendo a minha peraltice gritou à
moda cigana:
– Cachorro da moléstia! Cancão de fogo! Estás com o cão nos
couros?
Tive uma suave descida e lhe disse:
–
Eu gosto de me amostrar.
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